Anna Valéria Gueldini
TRH & COVID-19

Evidências epidemiológicas dos primeiros estudos em grande escala sobre a Síndrome Respiratória Aguda Grave causada pelo CoronaVirus-2 (SARS-CoV-2) sugerem que os homens são mais gravemente afetados do que as mulheres.

De acordo com estes dados, os homens apresentam piores desfechos, requerem maior tempo de internação e apresentam maior taxa de mortalidade quando comparados às mulheres. Os cientistas especulam que os hormônios femininos, especialmente o estrogênio, poderiam explicar os melhores resultados e a maior resistência ao vírus observada nas mulheres. Essa maior resistência se deve ao efeito sistêmico e local dos hormônios femininos nas diferentes células. Em particular, os estrogênios estimulam o sistema imunológico modulando a função de células que conferem imunidade.

Por que homens estão morrendo mais do que as mulheres?
A tendência foi observada inicialmente na China, onde o surto teve origem. Depois, se refletiu em países como França, Alemanha, Irã, Itália, Coreia do Sul e Espanha. Na Itália, 7 em cada 10 mortos são do sexo masculino. No Brasil, dois terços das mortes por coronavírus ocorrem em homens.

Teria o surto de covid-19 uma caráter “sexista”?
A resposta provavelmente não envolve um único fator, mas possivelmente uma combinação deles. Essa diferença significativa pode ser explicada com diferenças no estilo de vida, comportamento e na biologia diferente entre os sexos feminino e masculino.

Estilo de vida: Ao redor do mundo, homens tendem a beber e a fumar mais do que as mulheres e, portanto, ficam mais suscetíveis a desenvolver doenças pulmonares e cardiopatias, o que os fragilizariam caso contraíssem o coronavírus.

Fator comportamental: Estudos mostram que homens lavam menos as mãos do que as mulheres, tendem a usar menos sabão, assim como deixam de ir ao médico com regularidade e tendem a ignorar os alertas das autoridades de saúde.

Biologia: De acordo com estudo recente publicado na revista científica Human Genomics, o cromossomo X contém um grande número de genes relacionados à imunidade e, como as mulheres têm dois deles (os homens só tem 1), largam na frente no combate a doenças.

Pesquisas também descobriram que o estrogênio, hormônio sexual muito mais prevalente nas mulheres, protegeu fêmeas de camundongos infectadas pelo vírus da SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave), causada por outro tipo de coronavírus e responsável por um surto em 2003.

 

Se o estrogênio exerce função protetiva para o sistema imunológico feminino, será que a terapia de reposição hormonal pós menopausa exerce um efeito protetivo para covid-19?
Há evidências crescentes de que a TRH pode ajudar as mulheres na menopausa a se recuperar do vírus.

Sabemos que dois terços das mortes por coronavírus ocorrem em homens. Mas a taxa de mortalidade feminina de Covid começa a aumentar rapidamente quando as mulheres chegam aos cinquenta anos – após a menopausa, quando seus hormônios protetores, estrogênio e progesterona, desaparecem. Acontece, entretanto, que as mulheres que tomam a pílula anticoncepcional combinada ou a terapia de reposição hormonal – ambas as quais incluem estrogênio – têm menor risco de acabar no hospital e morrer. Geralmente, o estrogênio melhora o sistema imunológico, enquanto a testosterona tem um efeito imunossupressor.

Além de ser um hormônio sexual feminino, o estrogênio faz um excelente trabalho em todo o corpo e no cérebro. Ele regula a imunidade e a inflamação, e aquela aterrorizante “tempestade de citocinas”, que dilacera os pacientes com coronavírus em hospitais, é menos severa nas mulheres do que nos homens. A terapia de reposição hormonal avançou muito nas últimas décadas. E pode ser feita de várias maneiras, inclusive com hormônios idênticos ao que o organismo feminino produziria se não estivesse na menopausa e por via de administração transdérmica, que não altera fatores de coagulação. E já está bem estabelecido na literatura médica que a TRH, quando bem indicada e feita de forma individualizada, sempre respeitando as indicações e contra indicações, comprovadamente alivia os sintomas vasomotores (ondas de calor), trata os sintomas geniturinários, protege as mulheres de ataques cardíacos, osteoporose, diabetes, câncer de cólon e perda de memória. Por que não pensar também que a estrogenioterapia pode exercer efeito protetivo para a Covid-19?

A boa notícia é que pode! Um estudo recente que envolveu mais de 1.800.000 mulheres, provenientes de 465 clínicas de serviços de saúde na Inglaterra (banco de dados do Oxford Royal College of General Practitioners), onde foram observadas mais de 5.451 mortes por Covid-19, mostrou que as mulheres que estavam usando qualquer forma de TRH tinham 78% menos probabilidade de morrer de Covid. E esse dado foi constatado mesmo após ajustes para fatores que poderiam confundir os resultados, incluindo idade, peso, IMC, presença de doenças e outros fatores. Obviamente, há o preceito da mulher ter que ser saudável para optar por fazer TRH, mas esse viés não apaga a hipótese da terapia estrogênica potencialmente exercer um poderoso efeito protetor.

Em setembro, o aplicativo Zoe Covid Symptom Study também mostrou que as mulheres que tomavam pílula anticoncepcional tinham menos probabilidade de contrair o vírus. Mais tarde, uma pesquisa de banco de dados global TriNetX de 17 países, mostrou que mulheres que tomavam TRH com estrogênio tinham 50% menos probabilidade de morrer do vírus. O aplicativo Covid descobriu que a síndrome pós Covid é particularmente prevalente em mulheres com idades entre 50 e 60 anos e, além de problemas respiratórios, o resto dos sintomas relatados em mulheres têm uma grande sobreposição com os sintomas da menopausa – fadiga, insônia, nevoeiro cerebral, dores nas articulações e palpitações cardíacas.

Uma pesquisa online com 1.294 mulheres que sofrem os péssimos sintomas da síndrome pós Covid descobriu que a maioria das afetadas relatou que suas menstruações mudaram e que seus sintomas pioraram antes ou durante a menstruação, quando os níveis de estrogênio estão mais baixos.

Se o estrogênio pode salvar as mulheres do pior de Covid-19, elas deveriam recebê-lo?
A ciência sobre o estrogênio ainda não está completa – precisamos de estudos mais extensos à medida que percorremos a longa trilha do hospital para casa das pacientes que contraíram as formas graves de Covid.

Assim como os outros benefícios da TRH que não constam na bula da medicação e por isso não são indicações formais para seu uso, a prevenção de formas graves do Covid-19 conferida por essa suposta proteção estrogênica não precisa ser indicação para iniciar o tratamento. Mas ao menos traz um alívio para aquelas mulheres (e médicos) que acreditam que hormônio é fator de risco para tudo!

Referências:
1. Hajira Dambha-Miller, William Hinton, Mark Joy, Michael Feher, Simon de Lusignan Mortality in COVID-19 amongst women on Hormone Replacement Therapy or Combined Oral Contraception: A
cohort study medRxiv 2021.02.16.21251853; doi: https://doi.org/10.1101/2021.02.16.21251853
2. Wray S, Arrowsmith S. The Physiological Mechanisms of the Sex-Based Difference in Outcomes of COVID19 Infection. Front Physiol. 2021 Feb 9;12:627260. doi: 10.3389/fphys.2021.627260. PMID: 33633588; PMCID: PMC7900431.
3. Di Stadio A, Della Volpe A, Ralli M, Ricci G. Gender differences in COVID-19 infection. The estrogen effect on upper and lower airways. Can it help to figure out a treatment? Eur Rev Med Pharmacol Sci. 2020 May;24(10):5195-5196. doi: 10.26355/eurrev_202005_21298. PMID: 32495849.
4. Spagnolo PA, Manson JE, Joffe H. Sex and Gender Differences in Health: What the COVID-19 Pandemic Can Teach Us. Ann Intern Med. 2020 Sep 1;173(5):385-386. doi: 10.7326/M20-1941. Epub 2020 May 8. PMID: 32384135; PMCID: PMC7249504.
5. Suba Z. Prevention and therapy of COVID-19 via exogenous estrogen treatment for both male and female patients. J Pharm Pharm Sci. 2020;23(1):75-85. doi: 10.18433/jpps31069. PMID: 32324533.
6. Mauvais-Jarvis F, Klein SL, Levin ER. Estradiol, Progesterone, Immunomodulation, and COVID-19 Outcomes. Endocrinology. 2020 Sep 1;161(9):bqaa127. doi: 10.1210/endocr/bqaa127. PMID: 32730568; PMCID: PMC7438701.

 

 

Referências:
Mauvais-Jarvis F, Klein SL, Levin ER. Estradiol, Progesterone, Immunomodulation, and COVID-19 Outcomes. Endocrinology. 2020 Sep 1;161(9):bqaa127. doi: 10.1210/endocr/bqaa127. PMID: 32730568; PMCID: PMC7438701.

 

Perfil

Foto Perfil

Dra. Anna Valéria

Veja o perfil

Categorias

Dados de Contato

Dra. Anna Valéria Gueldini de Moraes
CRM-SP 101.372 • TEGO 0084/2003 • RQE nº46802

Consultórios

CAMPINAS
Av. Orozimbo Maia, 360 - 6º andar
CEP 13024-045 - Vila Itapura
Campinas - SP

Agendamentos:
Whatsapp: (19) 99920-1900
Email: annagueldini@gmail.com

ARARAS
Rua Benedita Nogueira, 70
CEP: 13600-120 - Centro
Araras - SP

Agendamentos:
(19) 99296-5167
(19) 3544-2478
Email: annagueldini@gmail.com