Anna Valéria Gueldini
Outubro Rosa

Terapia de reposição hormonal (TRH) e câncer de mama

Cada mulher experimenta a menopausa de forma diferente e os sintomas podem variar bastante individualmente. Esse período, se não for bem assistido, pode ser extremamente debilitante e ter um impacto significativo na saúde física e psicológica, na carreira, na vida social e nos relacionamentos da mulher de meia idade. Infelizmente, muitas mulheres ainda sofrem em silêncio e relutam em buscar aconselhamento e apoio devido às preocupações com os riscos de câncer de mama associados à TRH.

Afinal, existe motivo para preocupação?
As evidências atuais mostram que esse risco existe porém é muito pequeno e provavelmente muito mais associado ao componente de progesterona da TRH do que ao estrogênio.

A polêmica é grande e o tema voltou às manchetes mais uma vez no início deste ano, após um estudo sobre TRH e o risco de câncer de mama publicado na revista médica The Lancet.

Muitas vezes, a maneira como as descobertas cientificas são divulgadas nas mídias sociais pode confundir e criar certos temores infundados, tanto nas mulheres como nos médicos prescritores. No entanto, ler um estudo e haver a informação de que o risco de algo aumentou não significa muito se não se sabe qual era o risco inicial, não é mesmo?

Então, o que as mulheres precisam saber para basear sua decisão sobre o tratamento da menopausa?

As opções de tratamento dos sintomas da menopausa são, em primeiro lugar, individualizadas, embasadas em informações e envolvem escolhas. Cada mulher é única. E o histórico familiar e os fatores de estilo de vida devem ser levados em consideração. E nas decisões de tratamento, sempre os benefícios devem suplantar os riscos.

O estudo publicado no The Lancet mostrou que o risco de câncer de mama associado ao uso da terapia de reposição hormonal (TRH) está relacionado ao tipo de TRH e ao momento do uso da terapia hormonal. E os resultados gerais desta recente publicação estão de acordo com a orientação do Instituto Nacional de Excelência em Saúde e Cuidados (NICE) sobre o tratamento dos sintomas da menopausa, que observa um pequeno aumento do risco de câncer de mama associado a TRH.

Mulheres e médicos devem ter certeza de que os resultados deste estudo não acrescentam nada de novo em termos dos efeitos da terapia de reposição hormonal. A pesquisa mostra que, para a maioria das mulheres, a TRH ajuda a controlar os sintomas da menopausa e é segura.

As mulheres devem ser informadas sobre o pequeno aumento no risco de câncer de mama, para que possam comparar isso com os benefícios obtidos com o uso da terapia de reposição hormonal.

E o que se aprende com os dados desta recente publicação?
As descobertas desta pesquisa reforçam para mulheres e médicos a importância da janela de oportunidade terapêutica para se iniciar a terapia hormonal, bem como por quanto tempo e que preparação seria a melhor escolha – se estrogênio e progestogênio combinados ou estrogênio isolado. Essas descobertas não devem impedir as mulheres de fazerem a TRH se os benefícios – como alívio da sintomatologia, proteção dos ossos e redução do risco cardiovascular – superarem os riscos.

Para colocar o risco em contexto, uma mulher tem maior risco de desenvolver câncer de mama se estiver com sobrepeso ou obesa do que se fizer a terapia de reposição hormonal isolada. As mulheres devem estar cientes do efeito da obesidade e do álcool, que aumentam o risco de câncer de mama e modificam o risco adicional de TRH.

O que o estudo revelou?

Veja a ficha técnica:
O estudo publicado consiste em uma revisão de 58 estudos observacionais, totalizando 108.647 mulheres na pós-menopausa que desenvolveram câncer de mama, e tentou estabelecer a associação conhecida entre o uso da Terapia de Reposição Hormonal (TRH) e o diagnóstico de câncer de mama.

A publicação confirmou que a obesidade é um importante fator de risco para câncer de mama e fornece mais informações sobre o efeito de diferentes regimes de TRH e de diferentes progestágenos. O risco mais alto encontrado foi associado ao uso de estrogênio e progestagênio diário (regime contínuo combinado ou “sem menstruação”); seguido por estrogênio e progestagênio cíclico (sequencial ou “regime de sangramento mensal”); e, em menor grau, apenas estrogênio. Dos progestágenos usados, a didrogesterona associou-se ao menor risco.

Essas informações sobre os efeitos variados dos diferentes regimes de TRH devem ser sempre ponderados com o conhecimento de que regimes combinados contínuos oferecem melhor proteção contra a estimulação do revestimento do útero (endométrio) pelo estrogênio, do que regimes sequenciais. Lembrando que a TRH feita apenas com estrogênio isolado só pode ser administrada para mulheres que fizeram histerectomia, quando não há revestimento do útero presente.

Neste mesmo estudo, mulheres que iniciaram a TRH antes dos 45 anos foram analisadas e comparadas com mulheres na pós-menopausa com menos de 45 anos que não estavam fazendo TRH. O aumento do câncer de mama em mulheres mais jovens em terapia de reposição hormonal deve ser interpretado com cautela; ter uma menopausa precoce (antes dos 45 anos) diminui o risco de câncer de mama e fazer TRH até a idade média da menopausa restaura o risco para aproximadamente o risco basal para aquela mulher se ela não tivesse tido uma menopausa precoce. A menopausa precoce não tratada aumenta o risco cardiovascular e de osteoporose e está associada a um risco aumentado de morte prematura. A recomendação de que mulheres com menopausa precoce ou prematura devem receber terapia hormonal (a menos que tenham uma contraindicação médica formal, como câncer hormônio dependente) pelo menos até a idade média da menopausa, para reduzir problemas de saúde a longo prazo da menopausa precoce não tratada, ainda permanece.

Quais são as limitações do estudo?
Embora este estudo forneça informações importantes, existem limitações em relação aos tipos de estudos revisados (com 43.022 casos do muito criticado estudo The Million Women Study ) e ausência de dados sobre mortalidade associada ao câncer de mama; estudos randomizados relatados anteriormente, não mostraram nenhuma diferença significativa nas mortes por câncer de mulheres que fizeram TRH em comparação com o placebo.

O tópico do uso de TRH e desenvolvimento de câncer de mama continua a ser uma grande preocupação para mulheres e profissionais de saúde.

Quaisquer novos dados de pesquisa devem ser levados em consideração quando as mulheres estão decidindo qual é a melhor opção para elas. Deve-se notar que a crença atual é que a TRH pode estimular o crescimento de células cancerígenas da mama já presentes, ao invés de causar câncer, que poderia muito bem ter aparecido em uma data posterior se a TRH não tivesse sido feita. Como sempre, a escolha individual é essencial, equilibrando os riscos com os benefícios do controle dos sintomas e, portanto, a melhoria da qualidade de vida, saúde do coração e saúde óssea.

Já é recomendado que, quando decidida e iniciada a TRH, as mulheres devem fazer uma visita semestral em seu ginecologista. Nesta consulta serão avaliados benefícios e riscos para que uma decisão conjunta possa ser tomada sobre a continuidade ou não da TRH.

E quais seriam as mensagens finais após a leitura cuidadosa deste artigo?
1. O risco adicional de câncer de mama associado ao excesso de peso ou obesidade é seis vezes maior do que o risco adicional associado ao uso de TRH combinada.
2. A obesidade é um fator de risco importante para o câncer de mama – se a obesidade fosse uma droga, recomendaria-se que as pessoas não a usassem.
3. Considerando a alta proporção de mulheres com mais de 50 anos que estão com sobrepeso ou obesidade e o aumento progressivo da prevalência da obesidade na população mundial, este se torna um problema de saúde pública.

As mulheres devem ser informadas que o risco de câncer de mama com TRH é pequeno mas existe e depende do tipo de TRH. E que devemos sempre considerar nas decisões de tratamento dos sintomas da menopausa o risco de câncer de mama associado aos outros fatores do estilo de vida, como ingestão de álcool e obesidade, que se mostraram associados a um risco mais elevado para o câncer de mama em comparação com o uso da TRH. E nunca é demais lembrar sobre os benefícios gerais obtidos com o uso de TRH, incluindo controle de sintomas e melhoria da qualidade de vida feminina, bem como os benefícios para saúde óssea e cardiovascular associados ao uso de TRH.

 

Referências:

● 1. Collaborative Group on Hormonal Factors in Breast Cancer. Type and timing of menopausal hormone therapy and breast cancer risk: individual participant
meta-analysis of the worldwide epidemiological evidence (2019). The Lancet. doi: 10.1016/S0140-6736(19)31709-X
● 2. Green J, Reeves G, Floud S et al. Cohort Profile: The Million Women Study. Int J Epi 2018:1-7; doi: 10.1093/ije/dyy065

 

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