Anna Valéria Gueldini
Afinal, o que é o “Chip” da Beleza?

O termo “chip” da beleza ficou bastante popular após celebridades já “chipadas” propagarem nas mídias sociais os benefícios tentadores que tal dispositivo pode proporcionar, tais como acabar com a menstruação, e com ela a TPM, tonificar músculos, melhorar a libido e exterminar as indesejadas celulites. Mas esqueça o termo “chip”.

Esse dispositivo é um implante hormonal desenvolvido originalmente para evitar a gravidez e os desconfortos do ciclo menstrual, para reposição hormonal pós-menopausa ou para tratamento dos distúrbios hormonais. E o burburinho todo começou justamente com a divulgação dos tentadores efeitos colaterais, muito bem-vindos, já que melhoram a silhueta feminina. Além disso, os seus defensores justificam o uso pelo emprego de doses hormonais individualizadas, manipuladas com hormônios bioidênticos.

Hormônio bioidêntico é uma designação utilizada para substâncias hormonais manipuladas, sintetizadas em laboratório, que possuem exatamente a mesma estrutura química e molecular encontrada nos hormônios sintetizados pelo corpo humano. Terapias hormonais manipuladas são aquelas preparadas por uma farmácia de manipulação usando a prescrição de um provedor e podem combinar múltiplos hormônios, bioidênticos ou não, tais como estradiol, estrona, estriol, dehidroepiandrosterona, testosterona, progesterona e gestrinona.
Se os hormônios são bioidênticos, qual é o problema?

Essa é a primeira crítica das sociedades médicas: a nomenclatura tem sido utilizada indevidamente, pois estas são formulações hormonais produzidas em laboratórios de manipulação como se fossem novas opções de tratamento quando, na verdade, os hormônios bioidênticos são produzidos há anos pela indústria farmacêutica, disponíveis em inúmeros produtos já comercializados.
Além disso, formulações hormonais manipuladas podem apresentar diferenças sensíveis quanto à sua composição quando comparadas a produtos comercialmente testados e aprovados, podendo resultar em distintas ações e trazer dúvidas quanto à sua real eficácia e segurança. E por isso, existe uma grande discussão à respeito dessa manipulação hormonal, não só no Brasil, mas também nos EUA e na Europa, pois os órgãos que regulamentam a distribuição e fabricação dessas substâncias apontam possíveis problemas de segurança, como regulamentação e monitoramento governamentais mínimos, superdosagem ou subdosagem, presença de impurezas ou falta de esterilização, falta de dados de segurança, e falta de um rótulo descrevendo os potenciais riscos e efeitos adversos.

Alguns investigadores alegam que a melhor forma de ministrar o hormônio bioidêntico seria a via transdérmica. Estes autores sugerem monitoramento frequentemente, pela urina ou saliva, para avaliar os níveis hormonais das usuárias. Esta prática é muito onerosa e os resultados podem ser questionáveis, pois ainda não se sabe o nível hormonal ideal para cada mulher.
Portanto, o grande desafio com os hormônios bioidênticos é a individualização da dose a ser ministrada à paciente, pois há a necessidade de suporte laboratorial mais frequente e personalizado, o que aumentaria os custos enormemente sem necessariamente alcançar os objetivos do tratamento, ou seja, a melhora dos sintomas. Até o momento, não há comprovação científica que mostre que o seu uso, além de mais caro, traria mais benefícios às mulheres.

Finalmente, os implantes manipulados não são vendidos prontos no balcão da drogaria. Normalmente é o profissional de saúde que, no consultório, desenha uma fórmula individualizada, mais tarde preparada e inserida no implante por uma farmácia de manipulação. E sem que haja uma padronização, fica difícil não só estudar o implante manipulado mas também garantir que ele trará os resultados esperados, sem nenhum efeito colateral indesejável. E faltam evidências científicas robustas a favor desta tecnologia.

Performance como efeito colateral
O uso dos implantes hormonais não é uma novidade no Brasil. Desde 1982, o médico baiano Dr. Elsimar Coutinho utiliza e defende a técnica alegando que só fala mal quem não a conhece.
E a busca por esses dispositivos tem aumentado entre as esportistas devido a percepção de que, dependendo da dose utilizada e do histórico da paciente, os “efeitos colaterais” dos implantes podem variar desde diminuição do inchaço e da celulite, até ganhos de massa magra, que ajudam e muito no desempenho esportivo.
E quando falamos em performance, a gestrinona merece uma atenção especial.

A gestrinona é um hormônio sintético, derivado da 19-nortestosterona e apresenta efeitos antiestrogênico, antiprogesterona e ação androgênica. Inicialmente desenvolvida para uso via oral no tratamento dos sintomas da endometriose (doença na qual o endométrio se encontra fora do útero), atualmente é comercializada por farmácias de manipulação em forma de gel vaginal ou de implante subdérmico.

O implante em questão pode ser uma opção para tratamento de algumas condições ginecológicas que não responderam ao tratamento de primeira linha, como a endometriose e a adenomiose. No entanto, o implante de gestrinona acabou ganhando fama pelo potencial do dispositivo no ganho de massa muscular, redução da gordura corporal e eliminação de celulite, que o levou inclusive a ficar popularmente conhecido como “chip da beleza”.

Não é raro a paciente nos procurar falando que o professor da academia pediu para ela colocar o implante, pois o treino já não surte os efeitos desejados. Do ponto de vista médico, esse é seu maior problema: sua indicação nem sempre é bem realizada, feita em academias, ou por motivos estéticos, com o objetivo de ganho de massa magra. Neste universo da beleza a qualquer preço, pouco se fala sobre segurança, contraindicações e efeitos adversos. Além disso, esse aumento artificial da performance pode também aumentar a intensidade e volume de treinos de maneira brusca, sem períodos adaptativos, o que geralmente cursa com maior número de lesões.

Vamos conhecer como funciona o implante de gestrinona?
Trata-se de um implante subcutâneo que libera o hormônio gestrinona periodicamente. Esse implante é um tubo pequeno e fino de silicone, que contém a medicação no seu interior. A inserção é feita pelo médico, sob anestesia local, através de uma pequena incisão na pele. A durabilidade de cada implante varia de 6 a 12 meses. Depois desse período, é necessário um novo implante. Hoje em dia já existem os implantes absorvíveis, chamados de “pellets hormonais”, que não precisam ser retirados.
Como qualquer outro método hormonal, são necessários orientação médica e exames para verificar o estado de saúde prévios ao seu uso.

Efeitos potenciais
– Contracepção
– Interrupção da menstruação
– Aumento da libido
– Tratamento da endometriose
– Aumento de massa muscular

Possíveis efeitos colaterais
– Sangramento menstrual irregular
– Acne
– Aumento de pelos
– Aumento de oleosidade
– Queda de cabelos

Contra indicações

– Diabetes
– Obesidade
– Doenças cardíacas
– Alterações níveis colesterol
– Antecedente de câncer de mama, endométrio ou fígado
– Sangramento vaginal de origem desconhecida

Mulher informada, decisão compartilhada!
A indicação de um implante hormonal manipulado não é algo proibido ou negativo. Contudo, o ginecologista deve deixar claro para a paciente a real motivação para a decisão de escolha, além do motivo de não indicar métodos mais consagrados e respaldados pela literatura científica, como a pílula, o DIU (Dispositivo Intrauterino) e até mesmo o outro implante hormonal disponível no mercado, à base de etonogestrel.

Vale ainda lembrar que o implante de gestrinona é considerado doping pela Agência Mundial Antidoping (WADA) devido a sua ação androgênica e, portanto, absolutamente não recomendado para atletas.

Referências:
– Progesterone receptor modulators for endometriosis. Cochrane Database of Systematic Reviews 2017.
– Anabolic-Androgenic Steroids and Testosterone Precursors. Current Sports Medicine Reports 2004
– Misconception and concerns about bioidentical hormones used for custom-compounded hormone therapy. J Clin Endocrinol Metab 2012
– Endocrine Society – Position Statement, 2017
– Posicionamento da Comissão Nacional Especializada de Climatério da Febrasgo sobre implantes de gestrinona. 2018.
– Medicamentos e suplementos nos exercícios e esportes: dopagem e antidopagem, orientações de uso, riscos à saúde, responsabilidade profissional. Conselho Federal de Medicina. – Brasília, DF: CFM, 2018.

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